Estava aqui acompanhando a coletiva do Renato Gaúcho, o que tem sido cada vez mais um exercício legal de se fazer. Suas coletivas e entrevistas hoje vão completamente na contramão de 99,73% das coletivas enfadonhas e cheias de chavões dos treineiros da nação. Ao contrário do Renight de outrora, o Portaluppi está ponderado, equilibrado, sabe fazer uso do bom humor com sabedoria, o que faz com que mesmo quem não seja gremista acabe nutrindo uma simpatia natural e nada forçada.
Aliás, creio que resida exatamente nessa condição de ter aprendido a separar o Renight do Portaluppi, sem que com isso tenha sido necessário “matar” o personagem bonachão de outrora, o grande salto na carreira dele como técnico. O trabalho do campo é excelente, o Grêmio joga um futebol agradável, mas extremamente competitivo. Não é favorito contra os espanhóis, mas diante de tudo o que foi feito no ano e da convicção e condição de seu jogo, independente de adversário, tornou a distância entre o seu Grêmio e o adversário de amanhã menor do que se desenhava ser.
Sou simpático a disputa do Grêmio nesse sábado, menos pelo clube, mais pelo Renato, ainda mais pelo futebol brasileiro. Daquele velho chavão do “tal time é o Brasil na competição”, dessa vez o contexto que envolve a partida me faz crer, pela primeira vez, que possa ser verdadeiro.
A ofensividade bem trabalhada desse Grêmio do Portaluppi resgata um tanto do que perdemos no decorrer dos últimos tantos anos, onde nossos campões foram quase sempre forjados em moldes de covardia tática, na mais completa resignação e falta das convicções que o futebol brasileiro fora forjado desde sempre, o que encolheu ou impediu drasticamente de florescer os talentos que por aqui nunca rareiam.
Independente de o Grêmio vencer seu adversário de amanhã, se tivermos um jogo onde a disputa lhe gabarite a estar próximo do êxito, diante daquele que ostenta hoje a alcunha de melhor time do mundo, creio que possamos estar iniciando um caminho de volta ao que acompanhávamos nas décadas anteriores, com clubes brasileiros exercendo um jogo brasileiro, sem covardias, sem aguardar “aquela bola do jogo” e reduzindo as distâncias que o fator econômico imputa aos clubes de mercados tão díspares.
O ano de dois mil e treze deixou um legado para o futebol brasileiro: não só o fato de ter sido marcado por ser um ano em que o principal campeonato acabou como não deveria, confuso e apontando para uma injustiça indefensável (embora o maior prejudicado tenha sua parcela de culpa). O legado maior a ser apontado é o de que foi o ano em que o nível técnico caiu vertiginosamente, o que influirá definitivamente nas contratações dos clubes para este ano que se inicia.
Senão vejamos: clubes como Corinthians e Santos sofreram no ano passado o que pode ser chamado de ‘desmanche de um homem só’: perderam Paulinho e Neymar, respectivamente, e junto com eles a identidade de times campeões de quase tudo. É certo que ambos não eram exatamente as andorinhas que fizeram verão (mentira: Neymar era sim), mas foram símbolos da destruição do contexto vencedor.
Sem nenhum demérito ao campeão brasileiro, o Cruzeiro, premiado pela estabilidade e pelo bom e paciente trabalho de Marcelo Oliveira, técnico sem as mesmas patentes que os demais popstars dos esquemas táticos. A equipe mineira apostou no entrosamento e na boa fase de um meia que não é exatamente craque, mas fez jogadas e gols bonitos, o pequeno Everton Ribeiro.
Temos então um panorama para dois mil e quatorze: o das contratações difíceis. Os grandes foram embora e tão cedo não voltam. Nos restam os que já foram algo, com ou sem seus méritos, mas que hoje voltaram a ter que provar pra todo mundo que não precisam provar nada pra ninguém, com a licença da citação ao compositor popular. O Santos saiu na frente, trazendo o outrora selecionável Leandro Damião, que vivia um momento um tanto conturbado no Internacional, longe daqueles momentos que o levaram a vestir a camisa amarela da CBF. E como teria conseguido o alvinegro praiano contratar este multiplatinado atleta? Ah, claro: com o apoio de um fundo inglês, o Doyen Sports, representado no Brasil por um nome que causa calafrios em muitos torcedores santistas que têm boa memória e se lembram da malfadada época do patrocínio da Unicor: Renato Duprat, aquele que dirigentes do Corinthians não ousam estender a mão para cumprimentar, por causa da também malfadada época em que foi representante de outro fundo inglês (ao menos oficialmente), a MSI, liderada ou representada por Kia Joorabchiam. O resto da história todos já conhecem. O Timão então, sofre um pouco mais: até o momento só Uendel, lateral esquerdo da Ponte Preta, é nome certo nas contratações, e o time que parecia não precisar de nada no ano passado, campeão de Paulista e Recopa num ano de ressaca de outras comemorações, viu seu barco afundar em maus resultados na competição nacional, desgastando o técnico Tite, que deu lugar a Mano Menezes para tentar recomeçar.
Pelos lados do Morumbi, o São Paulo trouxe Luís Ricardo, ex-Lusa, para a lateral-direita, e mais ninguém. Perdeu Aloísio para o futebol chinês, e acaba de desistir do atacante chileno Vargas, do Napoli, que estava emprestado ao Grêmio, e interessa ao Santos. O motivo são os valores pedidos. Valores são também o que barra a renovação de Leandro com o Palmeiras, outrora moeda de troca por Barcos, mas que jogou bem na Série B e exige a tal ‘valorização’. Pode ser que volte para o Grêmio. No entanto, o Verdão foi o clube de SP que mais contratou, trazendo também Rodolfo do Rio Claro, França do Hannover (Alemanha), Diogo, ex-Lusa, e o principal, Lúcio, ex-São Paulo. Este último com um retrospecto não muito favorável no último ano, tem a chance de mostrar que ainda tem algum valor. Os demais, por mais que tenham já mostrado algo, especialmente Diogo, são apostas. Além deles, deve chegar Anselmo Ramon, em troca por Luan, que pode continuar no Cruzeiro. Ainda assim, voltando da série inferior, volta a ser um adversário forte, especialmente em seu centenário, com uma dose a mais de motivação, condizente com o nível técnico dos campeonatos, ao menos.
Há a tendência de se procurar heróis no futebol sul-americano, tática que já deu certo com Conca, Montillo, Guiñazu, entre outros, mas não trouxe exatamente um grande craque ao futebol brasileiro, apenas uma pequena ajuda.
Diante disso, e salvo engano do colunista, o ano de dois mil e quatorze, ano de Copa do Mundo jogada no país, tende ao marasmo no futebol regional e nacional. Além do evento maior do futebol mundial, há nos clubes uma tendência em economizar nos orçamentos, seja pra regularizar suas contas, seja pra tentar emplacar seus sucessores nas eleições para a presidência. O que veremos em nossos campeonatos, então? Mais times grandes lutando para não cair? Mais marasmo, com jogos sonolentos?
E finalmente, meus amigos, encerro meu questionamento da mesma forma como iniciei: qual será o legado que o ano da graça de dois mil e quatorze deixará para seu sucessor, além de – suponho eu – belos estádios?
A temporada de 2013 não consolidou a sequência de títulos do Santos e não manteve a equipe no topo. Mais do que isso, trouxe um melancólico vice campeonato Paulista frente ao maior rival e uma excursão absolutamente mal sucedida para a Espanha.
Os “8×0” repercutiram em todos os setores do clube. A turbulência política iniciada após o resultado ainda deixa suas marcas (fato que culminou em um “estratégico” afastamento de Laor) e o temor de que o time fosse sofrer ao longo do certame nacional, sendo um dos postulantes ao rebaixamento estava cada vez mais latente.
Contudo, ao contrário do que imaginavam, o Santos evoluiu e não seguiu ladeira abaixo. A safra de jovens, que diziam ter sido “queimada” após o histórico revés, não se abateu e hoje, a equipe tem se mostrado muito mais competitiva do que antes da derrota.
Ciente de suas limitações, o time mostra uma evolução tática e técnica e até mesmo na eliminação da Copa do Brasil (frente ao Grêmio) e na quebra da invencibilidade no Brasileirão para o Atlético-PR, não se comportou mal em campo.
Alguns jogadores tem se destacado – casos dos novos laterais Mena e Cicinho, dos meias Alison e Alan Santos e até os novos reforços do ataque Thiago Ribeiro e pasmen, Éverton Costa, “o centro avante que não é de fazer gols” – e o time vazado oito vezes pelo Barça, em tão pouco tempo passou a fazer frente aos melhores times do nosso futebol atualmente, atingindo o posto de 2° melhor defesa do campeonato.
Realmente, se o futebol e o elenco atual ainda não são ideais para um clube do porte do Santos, ao menos uma evolução é nítida e um 2014 melhor já pode ser vislumbrado. A mescla “juventude e experiência” tem dado certo e tem tudo para continuar assim, afinal, um time que está buscando dias melhores e é acostumado a formar bons elencos baseados em jovens promissores, pode sim acreditar em uma nova geração de meninos capaz de recolocar o clube no caminho das conquistas.
Por fim, talvez 2013 ainda nem seja realmente o ano desse time atual do Santos. Pode até ser também que a equipe apenas perambule pela zona intermediária da tabela até o fim do campeonato. Entretanto, em um campeonato tão nivelado e com times tão parelhos não se pode duvidar de nada, ainda mais de um grande clube.
Na última semana aproveitei o caso da suposta ofensa do técnico Roberto Fonseca contra o atacante Neymar para defender que haja diferenciação no linguajar da prática desportiva do linguajar da prática do preconceito. Não julguei um e outro, até porque Neymar retirou a acusação. Se por um lado o futebol vive seus dias mergulhado na tendência do insuportável politicamente correto, também é bem verdade que ele vem servindo de vitrine para práticas nada elogiosas de discriminação de todo tipo. Há de se saber separar um e outro sem que isso torne o futebol em algo enlatado.
De lá para cá ganharam espaço na mídia a polêmica em torno da comemoração do torcedor gremista, a tal da avalanche. Bem como a preleção de Oswaldo Oliveira no vestiário botafoguense. E ambos me servem para ilustrar ainda mais o saber diferenciar dessas situações.
A avalanche não é exclusividade gremista. E daí?
E daí que quando é a torcida do Boca Jrs ou outra argentina todo mundo acha o máximo e os riscos – que existem, sim – nunca são lembrados.
Li a pouco o post do Vitor Birner tratando do tema e ele menciona outras situações onde existe uma série de riscos, mas nem por isso se impede a prática. Um exemplo bem emblemático é o das rodas em shows de heavy metal ou outras vertentes musicais que a adotam.
Desde sempre se abrem rodas. Desde sempre gente se machuca, mas outras apenas se divertem. Saindo de olho roxo ou não. Simplesmente estão ali no meio, pois ali querem estar.
Birner é fanzaço das vertentes do metal. Eu já gosto mais de rock industrial. E ambos preferimos não entrar em rodas. Vez ou outra pego uma grade. Simples opção, ninguém me obriga a estar ali.
O torcedor que quiser ser parte da avalanche, que seja. Os que não quiserem têm todos os outros setores do estádio para acompanhar sua peleja. Mas sendo sabedor dessa prática de anos, devem sim os dirigentes e administradores do estádio gremista criar mecanismos que possibilitem a prática. Enfiar uma grade delimitadora, um cerco com cadeiras ou seja lá o que for, não irá dar certo. Já se teve uma demonstração clara na estréia da Arena gremista em jogos oficiais. Que se destine um espaço para a dispersão desses torcedores. Quem ali está sabe bem o risco e/ou o prazer que o espera.
O vestiário de um time de futebol é sagrado. É nele que o treinador faz a sua famosa preleção e tenta contagiar seus jogadores. E cada um tem um repertório diferente. Só não vejo muito espaço para cânticos gregorianos. Para inflamar aquela trupe toda, o linguajar do campo de futebol é muito mais propício. E foi dele que “O.O” se fez valer.
Felipão sempre fez isso. Luxemburgo também. E tantos e tantos outros, em outros tempos onde não havia essa moda do politicamente correto que tenta a todo custo pasteurizar e elitizar o esporte do povo.
Geninho sofreu com isso quando dirigia o Corinthians. O seu famoso “pega, pega, pega” foi classificado pelo pessoal do ar-condicionado como abominável. O “pega, pega, pega” poderia ter sido tantas outras coisas, dentre as quais uma simples ordem para fechar o espaço de marcação. A interpretação do jogador pode ter sido errada, como pode também ser errada a opção de um passe, um cruzamento ou um chute fora de hora. Geninho é hoje muito mais lembrado pelo “pega, pega, pega” do que como o técnico campeão brasileiro pelo Atlético PR.
Para o apaixonado pelo esporte o futebol de outrora é lembrado com muito mais saudosismo do que esse atual do politicamente correto é exaltado. É a visceralidade ante o superficialidade.
Por mais que pareça absurdo, ainda existem os que são contrários a adequação do calendário da pelota verde e amarela ao europeu.
Ainda que eu possa compreender os que gostam de que a temporada 2012 termine em 2012 e não em 2013, não dá pra aceitar que existam os que estejam felizes com as coisas do jeito que estão. A não ser o empresariado da bola que fazem seus pés de meias nas pré-temporadas européias, que são exatamente no meio das nossas.
Quem gosta de futebol não pode gostar do calendário atual.
No Linha de Passe da ESPN da última segunda-feira, Fernando Calazans comentou algo dito por outro jornalista, que me foge agora o nome, mas que dizia algo como: “Falta agora ao já campeão Fluminense apresentar enfim um futebol de campeão”.
A frase solta aos ventos não traz grande significância, mas trazida aqui para nosso contexto sim.
O Fluminense não apresentou até o presente momento um futebol de “campeão” simplesmente por não ter precisado.
Quem precisou foi o Atlético MG e este sim fez partidas de um grande campeão, ainda que tudo indique que não será.
Do goleiro ao centroavante o Fluminense é mais time que o Galo. O tricolor é mais time que Grêmio e São Paulo também. Mas não é mais que o Corinthians, por exemplo.
Se estivesse o Corinthians verdadeiramente no páreo e aí sim o Fluminense seria obrigado a fazer ao menos duas partidas de campeão. As duas contra o campeão da Libertadores. Não que o Galo não pudesse ter sido mais adversário do que vem sendo, mas ai já entramos em outros méritos técnicos. O São Paulo dessa reta final também poderia ser, o que não vejo no Grêmio.
O alvinegro paulistano não disputou o título pois o calendário fez com que as fases decisivas da Libertadores acontecessem exatamente quando o BR12 estava em suas primeiras rodadas. Só que as primeiras rodadas de um torneio de pontos corridos valem tanto quanto todas as outras. Abdicou de usar sua força máxima no início do BR12 para centralizá-la na Libertadores. Deu certo, mas eliminou qualquer chance de briga pelo bicampeonato nacional.
O calendário atual pune a competência. Pune os diferentes. Que o diga também o Santos, que com Neymar servindo a insossa seleção da CBF, atuou sem o seu diferencial em quase metade do campeonato. A média do time com sua estrela em campo dá margem para acreditarmos que o Peixe poderia estar brigando por Libertadores, pelo menos.
O Palmeiras não brigaria pelo título do BR 12, mas o invicto Campeão da Copa do Brasil é melhor que pelo menos metade dos times envolvidos. Não utilizou tantos reservas assim no início do BR 12, já que o elenco não permite, mas nitidamente tirou o pé do acelerador nas primeiras rodadas, enquanto nas fases finais da Copa do Brasil entrou com a faca entre os dentes. Depois por uma série de erros próprios, mas muito também devido aos insucessos do começo de BR12, hoje se vê diante de iminente rebaixamento.
Em 2011 assim também ocorreu e o Corinthians campeão não precisou ter um embate direto contra o Santos, então campeão da Libertadores e melhor time do país.
O titulo do Fluminense, se vier (e deve vir) será justíssimo. O time de Abel Braga atuou como precisou, da maneira com que a competição se apresentou. Não precisou brilhar, mas sim ser eficaz. Precisasse ser e certamente teria sido. Precisasse fazer frente ao Corinthians ou qualquer outro dos prejudicados pelo calendário e certamente teria feito.
O calendário agrada somente ao que se aproveita por ora. Hoje ao torcedor tricolor, isso basta. Ao torcedor de futebol , isso é bosta.