A tragédia que mudou os rumos do futebol inglês completa 20 anos.

Estamos no Brasil e a realidade aqui é diferente. Mas falamos de futebol e ele é o mesmo esporte em todos os cantos do planeta bola. Será que precisaremos ter a nossa própria tragédia, o nosso próprio massacre para que os rumos do nosso futebol também possam ser alterados?

O site GLOBOESPORTE.COM trouxe hoje uma matéria tratando do tema e é impressionante como em muitos pontos podemos fazer paralelos entre o passado tenebroso do futebol inglês com a nossa atual realidade nos estádios brasileiros. Por sorte ainda não tivemos a nossa própria tragédia para retratar.

Segue a matéria com pontos destacados onde eu encontro esses paralelos entre o passado inglês e o presente brasileiro.
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Incidente no estádio Hillsborough vitimou quase uma centena de torcedores do Liverpool e se tornou um marco na modernização do esporte no país

Rodrigo Sirico – Rio de Janeiro

Em 15 de abril de 1989, a Inglaterra viveu a maior tragédia da história de seu futebol. Liverpool e Nottingham Forest se enfrentavam pela fase semifinal da Copa da Inglaterra no estádio Hillsborough, do Sheffield Wednesday. A superlotação de uma das alas do estádio levou à morte 96 torcedores do Liverpool. A tragédia é até hoje sentida pela torcida dos Reds, mas acabou por se tornar um marco para a modernização do futebol inglês.

Relatório Taylor

O incidente foi encarado como a gota d’água para que os problemas com o futebol fossem resolvidos. O Lorde Taylor de Gosforth foi designado para conduzir o inquérito sobre os motivos para a tragédia em Hillsborough. Suas conclusões foram apresentadas no que ficou conhecido como “Relatório Taylor”. As principais causas apontadas para as mortes foram a falha do controle policial sobre a multidão e a inadequação das instalações do estádio.

O relatório sugeriu algumas mudanças que foram prontamente atendidas. As principais diziam que os estádios não poderiam ter grades ou alambrados para separar o público do campo. Além disso, todo torcedor que comprasse ingresso deveria ter uma cadeira para ver o jogo. As “gerais”, áreas nas quais se vê o jogo de pé, teriam de ser completamente abolidas.

Havia também regulamentação para preços de ingressos, sobre a quantidade de bilhetes destinados à torcida visitante e outras regras. Com a modernização dos estádios, os clubes passaram a faturar mais nos dias de jogos. Este fator é considerado como um dos principais para a ascensão do Campeonato Inglês enquanto negócio.

Como aconteceu a tragédia

Curiosamente, em 1989, o Hillsborough era um dos poucos estádios na Inglaterra considerados aptos a receber jogos de grande porte, como era aquela semifinal de Copa da Inglaterra. Não só pela capacidade (mais de 50 mil pessoas à época), mas justamente por ter alambrado separando torcedores do gramado.(uma das razões para o desastre)

No fim dos anos 80, a Inglaterra vivia o auge do hooliganismo(vivemos o nosso hoje, não?). Os clubes do país estavam banidos das competições europeias exatamente pelo mau compartamento dos fãs do Liverpool. A punição se deu após a final da Copa dos Campeões da Europa de 1985, no estádio de Heysel, na Bélgica, contra o Juventus. Na ocasião, 39 torcedores, a grande maioria do Juventus, morreram imprensados contra um muro após tumulto iniciado pelos fãs dos Reds.

Tendo este quadro em vista, a Polícia inglesa perdeu o controle da situação e demorou a entender que o desespero das pessoas que forçavam as grades da beira do campo se dava porque elas tentavam salvar suas vidas. Ainda assim, dezenas de policiais, em vez de ajudar as vítimas, formaram um cordão de isolamento no meio do campo, temendo que os “invasores” partissem em direção à torcida do Nottingham Forest para brigar.

Segundo a investigação, a tragédia aconteceu porque os torcedores do Liverpool com ingresso comprado não conseguiam entrar no estádio. Como foi dado o apito inicial, houve empurra-empurra do lado de fora e um dos portões foi aberto. A multidão se dirigiu diretamente à ala central, onde não havia mais lugares (deveria ter sido conduzida às alas laterais, que tinham lugares). Os torcedores que estavam junto ao alambrado foram esmagados. No total, 96 morreram e centenas saíram feridos.

15 de abril vira data sagrada para o Liverpool

A data é digna de tanto respeito por parte do Liverpool que o clube chegou a pedir à Uefa que não marcasse seu jogo de volta pela Liga dos Campeões, contra o Chelsea, para o dia 15 de abril. A partida foi realizada nesta terça, 14 (empate por 4 a 4 classificou o Chelsea). No último sábado, antes do jogo contra o Blackburn, pelo Campeonato Inglês, o minuto de silêncio em homenagem aos 96 mortos na tragédia foi carregado de emoção.

O clube mantém em seu estádio, o Anfield Road, um memorial com os nomes dos 96 mortos na tragédia de Hillsborough. O local tem uma chama que nunca se apaga, em respeito aos que perderam suas vidas naquele 15 de abril de 1989.

O atacante Fernando Torres dedicou os gols que marcou nos 4 a 0 sobre o Blackburn, no último sábado, às vítimas de Hillsborough.

– Estes gols são para os 96 e suas famílias, porque sei que sábado foi um dia muito importante para eles. Foi nosso jogo em casa mais perto da data do incidente – disse o espanhol ao site do Liverpool.

Polêmica sobre ‘A verdade’

Uma grande polêmica se iniciou nos dias seguintes à tragédia e perdura até hoje. O tabloide “The Sun” publicou em sua capa uma manchete em letras garrafais: “A verdade”. De acordo com a publicação, torcedores do Liverpool urinaram sobre os policiais que tentavam salvar vidas durante o incidente. Ainda, equipes de salvamento teriam sido agredidas durante seu trabalho.

A versão foi passada à imprensa por uma fonte policial que não quis se identificar.

Outros jornais chegaram a publicá-la, mas deram menos destaque e, de uma forma geral, pediram desculpas nos dias seguintes.

O “The Sun” manteve sua versão e é alvo até hoje de boicote na região de Liverpool. O tabloide, que vendia cerca de 200 mil cópias por dia naquela área, até hoje não chega a vender 20 mil.

– Lembro-me de como os torcedores do Liverpool se ajudaram, auxiliaram os que estavam em dificuldades e resgataram muitos. Nunca vamos esquecer aquele dia nem as 96 pessoas que perderam a vida. O país compreende esta situação e existe um enorme apoio moral por parte da população. Nunca vamos esquecer a forma como os torcedores se entreajudaram. É esse o verdadeiro espírito do Liverpool – disse no último fim de semana o primeiro ministro britânico, Gordon Brown.

fonte:
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Eu disse no início da coluna que ainda não tivemos a nossa própria tragédia para retratar. Bobagem ou inocência a minha. Nossa tragédia é cotidiana e ela é deflagrada quando eu e você somos impedidos de sair de nossas casas com as camisas de nossos clubes de coração simplesmente por medo, por não saber se seremos agredidos verbal ou fisicamente nas ruas, nos metrôs ou nos bares. É também escancarada quando temos de estudar medidas como clássicos com uma torcida só ou mesmo nos inúmeros casos de mortes nas cercanias dos estádios.

Acho que já temos nossos motivos, não precisamos olhar a desgraça alheia para ver que precisamos de mudanças para ontem.

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