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VIVENDO E DESAPRENDENDO

A esmagadora vitória do Barcelona sobre o Santos, bem como a excursão são-paulina por terras europeias, ainda que não totalmente negativa, tiveram o mérito de retrazer à tona a importante discussão a respeito da abissal diferença técnica que se instalou no futebol praticado no Velho Continente e no Brasil, algo que, se ainda não era, deve ter se tornado unânime. E as perguntas que ficam são: Por que ficou e até quando permanecerá assim?

FC Barcelona 8x0 Santos FC
FC Barcelona 8×0 Santos FC

O bombardeio do Bayern no gol do São Paulo, que apenas ficou no 2×0 graças ao ferrolho monstruoso armado por Paulo Autuori e às defesas de Rogério Ceni, bem como o passeio do Barcelona sobre o Santos que resultaram no cataclísmico 8×0 foram estopim na semana última para colocar o ex-país do futebol no seu atual devido lugar: a completa submissão à Europa no clássico estilo relação centro-periferia entre colonizadores e colonizados.

Se as coisas sempre foram assim na vida, ao menos no futebol os sul-americanos tinham a seu favor os aspectos talento e técnica como forma de pequena vingança para o terrível complexo de inferioridade, não à toa existente nos corações e mentes dos americanos meridionais.

Não mais, e várias são as teorias. Alguns motivos são de dedução óbvia.

A última vez que viu-se, em Copas do Mundo, a Seleção Brasileira formada por jogadores majoritariamente atuando em clubes brasileiros foi na já longínqua Copa da Espanha de 1982. Lá, somente Paulo Roberto Falcão atuava em terras europeias (AS Roma) entre os titulares de Telê Santana.

Em seguida, vieram a abertura gradativa do mercado europeu para jogadores extra comunitários, o recrudescimento do panorama econômico brasileiro, sem mencionar a desorganização interna do futebol profissional tupiniquim.

FC Bayern 2x0 São Paulo FC
FC Bayern 2×0 São Paulo FC

O resultado não poderia ter sido outro além do êxodo em massa dos maiores talentos brasileiros rumo ao Velho Continente. Com isso, a Seleção Brasileira começaria a ser esmagadoramente desfalcada de jogadores atuando em terras locais. O Brasil tornara-se apenas exportador de força de trabalho com um modelo bem claro baseado em Seleção Nacional forte à base de grandes nomes de brasileiros brilhando em grandes agremiações europeias e clubes fracos.

Tal quebra de espinha dorsal foi perversa para o futebol interno praticado no Brasil. Evidentemente, as explicações dos problemas de defasagem não ficam por aí. Ora, todos sabem das questões referentes a desorganização, calendário e assim por diante.

Eis que, esporadicamente, surgem oportunidades do País assistir representações nacionais enfrentando os badalados e midiáticos europeus como aquelas da semana que passou. E, para decepção geral, os resultados não são bons ou, quando são, os goleiros das equipes brasileiras são, via de regra, escolhidos como os melhores em campo. Nada de tão auspicioso, apesar da capacidade demonstrada pelos guarda-redes em questão.

O que se vê atualmente são clubes europeus que formam verdadeiras seleções mundiais de futebol sim, mas também equipes com incrível disciplina tática e busca incessante pela perfeição, precisão de passes e velocidade no jogo. Algo anos-luz à frente do cadenciado, lento jogo brasileiro.

Para muitos profissionais da bola, pesa a questão do poder de fogo dos europeus em termos de contratações. Resumidamente: o treinador na Europa pode montar a equipe taticamente a seu critério. A partir do momento que o técnico desenha o plano tático que deseja implantar na equipe, os dirigentes vão atrás de jogadores para suprir àquelas mesmas necessidades táticas. Já no Brasil, o treinador monta a equipe como pode de acordo com os jogadores que possui em mãos para trabalhar.

Já outros bem ressaltam a questão da educação do jogador brasileiro, muitas vezes indisciplinado.

Argumentos que pesam, sem dúvida. Aspectos levantados que muito poucas equipes executam no Brasil. O Corinthians é um dos poucos. O plano tático do técnico Adenor Bacchi Tite é seguido à risca dentro de campo. Já fora dele, quem não se adequa à disciplina criada no futebol do clube é, geralmente, expurgado. Ainda assim, o Timão, apesar do alto nível de competitividade apresentado contra o Chelsea inglês na final do Mundial de Clubes da FIFA de 2012, necessitou do excelente trabalho do goleiro Cássio para garantir a vitória por 1×0 e o título.

Um São Paulo, em crise é verdade, acuado em campo contra o Bayern em Munique, é o que se viu. Houve maior equilíbrio contra o Milan sim, mas o Milan não é mais o mesmo de outrora. Já contra o Benfica, pelo menos o time brasileiro venceu por 2×0, sendo sufocado no 1º tempo e partindo para o ataque na etapa final.

Já o Santos sofreu triste humilhação em Barcelona.

Olhando o futebol europeu atual e comparando-o com o brasileiro, paixões clubísticas nacionais à parte, vê-se enorme involução pelos lados de cá do Atlântico. Os brasileiros desaprenderam? Só crescem quando partem para a Europa?

Eis o desafio maior a partir de agora. Como correr atrás de tal déficit?

Obviamente, o processo de crescimento passa pela melhora e maior profissionalização do gerenciamento dos clubes brasileiros, bem como dos campeonatos disputados por essas terras. A equação campeonatos estaduais versus campeonatos brasileiros deve ser resolvida urgentemente. É mais ou menos assim: o futebol brasileiro é um grande negócio em potencial, porém muito mal explorado.

Categorias de base? Como funciona de fato o setor de descobrimento de talentos no País?

Educação de cunho profissional dos atletas com o intuito de torná-los mais conscientes a respeito do aspecto da obediência tática. Futebol profissional tem se tornado sempre menos coisa de boleiro e mais coisa de atleta. O brasileiro deve se tornar um alemão com isso? Logicamente que não. Contudo, reside aí grande desafio comportamental para a própria sociedade brasileira. Como adquirir maior seriedade no trato das questões profissionais sem deixar de lado a afabilidade brazuca?

Com vontade é possível. Exemplos? Telê Santana era em certo ponto. Apesar dos aspectos extra campo jogarem contra, o saudoso Mestre Telê primava pela obsessão da busca do jogo rápido de passes. Algo que seria obtido com muito treinamento visando o aprimoramento de fundamentos. Assim foi montada a Seleção de 82 ou o São Paulo de 92, para ficar em dois exemplos.

As necessidades do futebol brasileiro são urgentes. Enquanto nada é feito, resta a indagação: até quando deveremos amargar tamanho abismo técnico entre europeus e brasileiros?

HÁ 30 ANOS MORRIA PARTE DE MIM EM BARCELONA

Pois é, a impiedosa roda do tempo diz que já se passaram 30 anos daquele 5 de julho de 1982. Copa do Mundo da Espanha, cidade de Barcelona, Estádio Sarriá, segunda fase, grupo da morte formado com Brasil, Argentina e Itália.

Seleção Brasileira de 1982

A Itália classificara-se em segundo lugar após três medíocres empates com Polônia, Peru e Camarões. A Argentina era a defensora do título conquistado em casa em 1978, agora  com o reforço do jovem super craque Diego Maradona.

E o Brasil?

Histórica capa do Jornal da Tarde do dia 6/7/82. Representação perfeita do sentimento nacional naquele dia.

Ah, o Brasil! Todos da minha geração conhecem muitíssimo bem a história, os mais jovens talvez somente tenham ouvido falar ou visto alguns vídeos dos jogos.

Era o Brasil do técnico Telê Santana. Uma verdadeira Seleção Brasileira, moldada à base de geração de craques dentro e fora de campo. Indivíduos intelectualizados, cada um à sua maneira, nada relacionado ao que se vê hoje no futebol.

A Itália vence a Argentina por 2×1. O Brasil vence a Argentina por 3×1 eliminando-a após atuação de gala do time.

Eis que vem a partida final do grupo. Brasil x Itália. Era um 5 de julho, uma segunda-feira. Muita festa e absoluta confiança da torcida brasileira tanto no País quanto em Barcelona que vivia período estival tipicamente mediterrâneo. Mais parecia o Rio de Janeiro, seja pela temperatura, seja pela festa brasileira que cativava toda a população local.

Não era para menos, a Seleção de Telê Santana jogava por música e, por ter obtido melhor saldo, necessitava de um empate contra os italianos.

 O resto da história todos conhecem. Os 3×2 italianos sobre os brasileiros. A derrota repleta de malefícios para o futuro do futebol tupiniquim. O processo de globalização que chegava ao mundo da bola via abertura do mercado europeu para jogadores extra-comunitários. O processo de degradação econômico-social do Brasil, ainda em vias de redemocratização. O êxodo de nossos craques pós-82. Paolo Rossi.

Paolo Rossi e Junior

Sim, Paolo Rossi. Italiano da cidade de Prato, na Toscana. Injustamente conhecido como “carrasco” no Brasil através da imprensa esportiva chavão.  

Fazer o quê? Que culpa tem Rossi? Apenas defendia as cores de seu país. Fez o seu trabalho.

Naquele 5 de julho, lembro-me de estar em casa com minha família em São Paulo no alto de meus 9 anos de idade.

Lembro-me dos sentimentos de pureza e inocência que ainda carregávamos conosco. Talvez uma forma de ver o mundo que fosse proveniente da adoração aos personagens de super heróis da infância com os quais sonhávamos ser. Um mundo maniqueísta, onde o bem e o mal estavam claramente definidos e o bem, sob nosso inocente ponto de vista, fosse sempre prevalecer.

Falcão e Rossi

Para a minha geração, já sob o olhar do distanciamento adulto e histórico, aquela Seleção de 82 representava exatamente este super herói imaginário. O time do jogo bonito no maior grau de pureza possível. O time de craques heróis, quase ou totalmente infalíveis e que tínhamos o hábito de vê-los todos os finais de semana nos estádios e na televisão, pois quase todos atuavam por equipes brasileiras.

Lembro-me claramente do momento em que o jogo estava 2×1 para a Itália. 2º tempo. O jogo era truncado. Cláudio Gentile, que fora implacável na marcação a Maradona, repetia a dose contra Zico.

Aí veio o emocionante momento do gol de Paulo Roberto Falcão. Chute forte, de esquerda, no canto do excelente goleiro Dino Zoff. Chute que foi possível graças a passagem de Toninho Cerezo pela direita que atraíra a marcação e abrira espaço para o arremate. Gol do Brasil! A narração de Luciano do Valle na Globo (sem pieguices dos tempos atuais) e a comemoração de Falcão eram arrepiantes… e continuam a ser até hoje. Revejo as imagens, mas na minha memória vem aquele 5 de julho de 1982, na sala da casa de meus pais em São Paulo. Aquele dia é muito nítido nas minhas lembranças.

No final, com a partida em 3×2 para a Itália, o último lance brasileiro. Cruzamento na área e o zagueiro Oscar Bernardi cabeceia. Dino Zoff fazia incrível defesa.

Era o fim do sonho. Seria a primeira e única vez que choraria por causa de uma partida de futebol.

Foi-se a Copa de 82. Foi-se aquela ilusão infantil. Era o fim da era da inocência para minha geração.

Bom dia vida real! Bem vindo à dura realidade da aventura que se chama viver!

Recentemente, tive certo consolo, não muito, quando do falecimento do Dr. Sócrates. Segundo relatos de alguns jornalistas amigos do craque, o inesquecível Magrão teria dito, em justificativa às peças que o destino nos prega, que se eles tivessem vencido aquela Copa, teriam se tornado seres humanos insuportáveis. Análises de um verdadeiro intelectual. Algo raro hoje no futebol.

Passaram-se 30 anos, mas me lembro, como se fosse hoje, daquele 5 de julho de 1982.

Nunca mais tive o mesmo sentimento por nenhuma outra Seleção Brasileira posterior. Não há mais Telê Santana, não há mais Dr. Sócrates, nem Zico, nem Serginho Chulapa e seu jeito único de ser, nem Paulo Roberto Falcão, nem Éder, nem nada.

Parte de mim morreu em Barcelona naquele 5 de julho de 1982.

 

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=pNEtXoP1BsQ[/youtube]

Olê, olê, olê, olê, Telê, Telê…

Se hoje em dia os treinadores reclamam de um calendário apertado, que fazem suas equipes jogarem apenas duas vezes por semana, em 1994 o mestre Tele Santana teve que preparar dois times do São Paulo Futebol Clube para jogarem no mesmo dia.

Em uma noite em que o jogador Juninho Paulista atuou nas duas partidas, o tricolor jogou pela Copa Conmebol contra o Sporting Cristal do Peru e pelo Campeonato Brasileiro contra o Grêmio e venceu as duas por 3 a 1. Contra os peruanos, Juninho fez um dos gols.

Tele Santana, que hoje, 26 de julho, estaria completando 80 anos de idade, é um dos grandes responsáveis por esse amor incondicional que eu tenho pelo futebol, e o grande responsável pela minha única superstição futebolística, a de usar uma Lacoste vermelha nos jogos clássicos e decisivos do tricolor.

A minha admiração por ele começou bem antes da sua chegada pelos lados do Morumbi, onde veio para tirar o time do fundo do poço e o levar para à final do Brasileiro, contra o Corinthians, e mesmo perdendo o título, Telê tinha a aprovação da torcida, que o fez permanecer no clube.

Ele foi o treinador da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 82, na Espanha, a primeira que eu acompanhei de verdade, colecionei figurinhas e tive orgulho de ter nascido em um país que tinha um
selecionado que encantava o mundo com um futebol bonito e envolvente.

Infelizmente não trouxemos o caneco, depois da fatídica derrota pelo placar de 3 a 2, para os italianos, que se sagrariam campeões daquele ano.
Derrota essa conhecida até hoje como a “Tragédia do Sarriá”.

Não conseguindo ganhar também a Copa do Mundo de 1986, no México, Telê então foi marcado com a pecha de “pé-frio” por parte da imprensa brasileira.

Marca essa que ele chutou para bem longe nos anos em que ele treinou a equipe do São  Paulo, onde levou o time a vencer 10 títulos importantes (fora torneios menores), entre eles, 2 campeonatos
paulistas, 1 Campeonato Brasileiro, 2 Libertadores e 2 Mundiais de Interclubes.
E com uma formula bem simples: jogar pra ganhar, sempre, em qualquer situação.

Na Libertadores de 92, o primeiro grande título internacional do Tricolor: campeão em cima dos argentinos do Newell’s Old Boys, o Palmeiras havia inaugurado sua parceria com a Parmalat indo pra final do campeonato paulista com o São Paulo e tomando uma golada de 4 a 2 no primeiro jogo. No intervalo do primeiro para o segundo jogo da final, o São Paulo foi até Tóquio e ganhou o Mundial de Interclubes em cima do todo-poderoso Barcelona espanhol e voltou para consagrar o
paulistão daquele ano.

Tem treinador que reclama de um calendário apertado. Eu reclamo desse calendário ter passado rápido demais e ter levado o treinador mais importante que esse pais já teve!

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=JidfhF_7YJU[/youtube]

Um jogo para Telê


Hoje no Mineirão jogam São Paulo e Atlético Mineiro.

Além disso, hoje também será inaugurado um busto em homenagem aquele que, na minha opinião, foi o maior técnico desse país.

Telê Santana terá hoje seu rosto imortalizado no estádio em que pisou tantas vezes. A ocasião não poderia ser mais propícia, pois Telê é lembrado com grande carinho pelas torcidas dos dois times.

Falo em nome de todos os delinquentes do FFC quando peço: que o futebol apresentado seja digno da pessoa homenageada!