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GLORIOSOS DE TODAS AS CORES

Da manhã onde a seleção do único esporte onde o Brasil deveria ser sempre ouro teve mais uma vez uma opaca prata de brilho pouco intenso, brilhou o ouro intenso do bicampeonato olímpico de quem quase não se esperava cor alguma. Continuou brilhando e espelhando, nos golpes de prata, mas dourada por merecimento, o esforço e a superação de gente de um esporte sem quase/ ou nenhum apoio. Brilhando intensamente em uma prata dramática que de ouro certo tonalizou uma tristeza passageira pela derrota doida e doída, mas de claridade de um diamante lapidado por mais de década de um trabalho sem parâmetros, de 30 títulos em 40 disputados. E que fechou uma participação de glórias parcas em abundância, mas de glórias inestimáveis em superação e em dedicação, com um 5º e um 8º lugares de um percurso sofrido, dolorido, sem padres, mas com sensação de dever cumprido. Ganhando ainda, de onde sequer se sabia que havia representatividade verde e amarela, uma cor bronzeada de um esporte que na verdade são cinco e nos quais ela esteve sempre no topo.

De uma seleção brasileira de futebol masculino, que vive mais uma vez um papel de “vilã”, a uma sequencia de gloriosos e inestimáveis heróis olímpicos, medalhistas ou não, de cores variadas, tonalidades penduradas no pescoço ou carregadas na pele. Heroínas do vôlei feminino bicampeão na superação e com seu comandante 3 vezes dourado pela história. Do magnífico Esquiva Falcão, herói solitário de um esporte marginalizado pelo sistema. Dos heróis que entristeceram uma manhã dourada pelo sol, por um ouro certo que veio na prata abrilhantada por um trabalho de longuíssimo prazo, nunca menores por uma derrota gigantesca diante de um adversário gigantesco em todos os sentidos. De vitoriosos sem medalhas, como Marilson Gomes dos Santos e sua enorme 5ª colocação na maratona masculina, companheiro de um monstruoso Paulo Roberto de Almeida, que na 8ª colocação fez o Brasil que acompanhava ainda entristecido pela derrota no vôlei, sentir orgulho de um herói que chegou chorando de emoção e de dor, trazendo ainda consigo um Frank Caldeira na 13º. E de uma vitoriosa e bronzeada Yane Marques em um esporte que compreende em si outros 5, nos quais em todos ela esteve no topo e pelo qual nós mal sabíamos que estávamos tão bem representados.

Não somos potencia olímpica. Somos potencia em alguns esportes. Temos potencial para potencializarmos a nação olimpicamente. E em um cenário de muitos heróis e poucos vilões, podemos esperar por dias melhores, por edições olímpicas mais vitoriosas. Devemos exigir dias melhores para os que tentam nos dar dias tão intensos como o sábado e o domingo olímpico.

A todos esses – e apenas a eles – que se juntam a tantos outros, medalhados ou não, dessa e de outras edições, deixo aqui o meu enorme muito obrigado.

 

NOSSO MAIOR LEGADO OLÍMPICO: APRENDER A TORCER.

O Brasil não é potencia olímpica. E isso parece ter ficado bem claro, pelo menos para a massa mais atenta de torcedores. E nós, torcedores de uma forma geral, não sabemos patacoada alguma sobre a grande maioria dos esportes olímpicos.

O que não nos impede – e nem deve impedir – que torçamos pelo êxito dos atletas da nação. O que é diferente de torcer pelo “êxito da nação”, quando expandimos o conceito de “nação” para a maior parte das confederações e o governo, que nada ou muito pouco fazem pelo esporte.

Mas me parece que essa ducha de água fria, tardia é bem verdade, que tomamos com as “decepções” olímpicas pode ter servido para nos calejar. Pode nos ensinar também a torcer com coerência.

O Brasil produz pouquíssimos atletas de alto nível, daqueles que chegam a uma Olimpíada com status dourado. A esses poucos é depositada toda a esperança dos torcedores, que por sua vez comprou o discurso ufanista, pachequista e achista da maioria esmagadora da imprensa e das enganosas propagandas governamentais.

Este raro atleta brasileiro irá disputar o ouro, que lhe é conferido obrigatoriamente, contra outros tantos de mesma capacidade, mas muitas vezes de nações que não depositam neles a esperança de brilho no quadro geral de medalhas. Suas derrotas não lhes conferem status de vilões olímpicos. Mas aos nossos sim.  Pela expectativa desmedida, pelo isolamento sistêmico ao qual o raro atleta brasileiro de alto nível está inserido.

Mas OK, muito já foi dito sobre nossa maneira errada de torcer. Aqui quero chegar onde podemos chegar como torcedores.

E andamos apanhando bastante, muitas vezes da mesma mídia que nos vende gato por lebre.

A 1ª metade dos Jogos Olímpicos Londres 2012 nos reservou uma estréia gigantesca, com 3 medalhas, uma de cada cor, mas um restante de decepção de mesma magnitude. Até que surgiu Arthur Zanetti com um inesperado – e pouco acompanhado – ouro nas argolas. O 1º ouro olímpico não apenas do Brasil, mas da América Latina nesta modalidade. Um feito colossal.

Arthur não era dos atletas mais comemorados pela mídia. A grande maioria do público sequer sabia de sua existência. Agora sabe. Só não pode agora achar que toda vez eles será obrigado a ganhar ouro. Ele não disputa sozinho, ele não está no topo do esporte sozinho. E me parece que esse entendimento no torcer está sendo enraizado na mentalidade do torcedor médio brasileiro. As críticas e as piadinhas fora de hora parecem estar diminuindo. O aplauso pelo êxito do desconhecido, muitas vezes desfavorecido, anda dando um tom distinto ao nosso torcer.

A vibração pelo ouro de Zanetti veio na mesma proporção aos êxitos de Adriana Araújo e Esquiva Garcia. Boxeadores brasileiros que ao chegar às semifinais já garantiram ao menos o bronze. Bronzes que já reluzem mais que ouro. Medalhas que chegam por um esporte que não nos confere pódio olímpico há 44 anos, quando um gigante de nossa história trouxe um bronze que vale mais que diamante.  Adriana e Esquiva não são sucessores, são representantes da escola e do legado de Servílio de Oliveira. Heróis olímpicos vindos de um esporte de pouco/quase nenhum apoio ou de destaque na imprensa.

Os feitos desses atletas são maiores que as “decepções” de nossos grandes nomes. E admirar e torcer por essa gente me parece que será o legado positivo que esses jogos Olímpicos nos deixarão.

Temos ainda o renascimento do basquete masculino, que venceu a poderosa Espanha mesmo sabendo que entrariam no caminho dos imbatíveis estadunidenses. Da seleção feminina de handebol, que infelizmente foi eliminada há pouco pela Noruega, uma potencia desse esporte, “apenas” campeã olímpica e mundial, por 21X19. Uma campanha fantástica e que abre – ou deveria abrir – uma perspectiva de novos investimentos.

Precisamos aprender a esperar sim as vitórias onde somos poderosos, como no vôlei masculino e feminino e nas duplas de quadra femininas e masculinas. Mas se não vierem medalhas douradas, podemos dizer algo contra a seleção comandada pelo Bernardinho, por exemplo? Pra mim a mais espetacular seleção de qualquer esporte em todos os tempos, principalmente pelo tempo em que vem se mantendo no topo. Mais de década.

Mais do que esperar e torcer pelas vitórias certas, devemos aprender a exaltar as incertas – e a lamentar por serem incertas. Somente quando produzirmos atletas de alto nível em série é que poderemos comprar o discurso de potencia olímpica.

Comprar não, assimilar. Pois além de aprender a torcer, precisamos aprender a fugir da manipulação e do oba-oba desmedidos e oportunistas de épocas olímpicas.