O BARCELONA VIVE HOJE NO MUNDO QUE É SÓ SEU

Por: João Paulo Tozo

Quando no futebol se diz que tal time possui alma, entende-se que aquele escrete possui força para superar momentos de adversidades técnica, numérica, histórica.

Ao longo desses meus pouco mais de 30 anos vi uma série de grandes esquadrões que venciam batalhas árduas na bola, mas também na garra e na vontade.

Foram times que muitas vezes testemunharam contra a tradição do clube para atingir um objetivo maior ou talvez inalcançável naquele momento.

Times que duraram ou duram poucas temporadas, pois possuem uma filosofia que não é a do clube e o clube, grande culpado nesse processo todo, não plantou sua essência na formação de seus jogadores. Jogadores que crescem sem identificação com clube e saem para outro qualquer antes de sequer chegar ao topo da cadeia. Clubes com times que jogam de uma forma hoje e de outra amanhã, sob tutela de um comandante diferente a cada nova temporada.

Cada clube nesse planeta chamado futebol possui a sua assinatura, a sua marca registrada, aquele diferencial que o distingue dos demais. Mas somente um parece respeitar esse processo e elevá-lo a potencias hoje inalcançáveis.

Poucas vezes na história do futebol um clube elevou a um grau tão alto a chamada “alma” como esse Barcelona. Não o Barça do Guardiola, apenas.

Alma não do time, mas do clube. Em essência, um clube preparado e preparador de esquadrões.

Não um clube de estrelas, mas uma constelação formada pelo clube e para o clube. Um diferencial tremendo em relação a todos os demais e que o torna hoje algo único no planeta bola.

Não simplesmente a base da atual seleção campeã do mundo, mas a base de filosofia intrínseca e moldada desde a 1ª esfera preparatória do futuro profissional do clube.

Não há preparação tática. Há preparação filosófica. Há a preparação para o encantamento ao qual o futebol se propõe como esporte.

O treinamento tático do garotinho de 8 anos é o mesmo que recebe o maior de todos os homens do atual cenário da pelota e é a mesma que ele também recebeu quando chegou ao clube com 13 para 14 anos.

A transição de categoria é definida pela idade, não pelo jogo. É por essas e tantas que ninguém se assusta quando estréia para jogar ao lado de Messi. É por isso que o patamar do jogo do time de cima não muda, mesmo que mude a qualidade individual, já que isso a filosofia instaurada na alma do clube não consegue inserir no individuo.Mas o individuo é preparado para ser parte do todo.

Rasgue tudo o que você aprendeu na vida sobre 4.4.2, 4.3.3, 3.5.2 e mesmo nos  4.3.1.2 e suas variáveis.

Passe a compreender o 3-7-0 que prepara a jogada para ser finalizada com êxito pelo 3-0-7 ou ser defendido pelo 10-0-0.

Esqueça a velha escalação do goleiro ao centroavante. Esqueça o conceito de zagueiro, de meia, de atacante.

Volte a pensar em futebol total. Em futebol maioral.

Entenda o quanto pode ser normal o lateral direito ser meia direita e ponta na mesma jogada e na seguinte já estar na ala esquerda preparando a jogada para que o maior de todos de nosso atual cenário possa finalizar como um centroavante que não é – ou é também.

Comece a assistir os jogos do time azul e grená olhando para o setor do campo onde a bola não está. É lá que tudo está acontecendo. É lá que a movimentação e troca incessante de posições acabam por trucidar o esquema tático do pobre adversário que ainda enxerga o jogo por setor, por posição, por marcação.

Entenda o porquê um centroavante fantástico e de técnica refinada como Ibrahimovic não deu certo por lá. Por que um magistral Ronaldinho Gaucho, de história ímpar dentro do clube, foi simplesmente dispensado. Entenda que para fazer parte desse todo o sujeito precisa ter muito mas do que técnica, mas sobretudo entender a filosofia do clube e não somente do time.

O Barcelona hoje forma indivíduos, enquanto seus adversários são formados pelos indivíduos.

Os 4X0 inapeláveis diante do melhor time da América voltou a definir a condição de cada um.

O Santos é um belo time, mas compará-lo ao Barcelona foi além de leviano, pouco inteligente. Tentar postar o cracaço Neymar na condição de postulante a vaga de extraterrestre de Messi foi infantil por parte de todos os que entraram nesse oba-oba.

Existe um mundo que separa os times e suas estrelas. Um mundo de 75% de posse de bola. Um mundo de inapeláveis 4X0 que saíram ainda baratos diante da monstruosa diferença.

Um mundo onde hoje reside somente um clube. O mesmo mundo onde viveu a seleção de 70, o Santos de Pelé, A Laranja Mecânica de Cruiyff (responsável pela implementação da atual filosofia barcelonista), a Academia Palmeirense de Ademir da Guia, o Flamengo de Zico, o Inter de Falcão, o Madrid de Di Stefano e podemos aí citar mais alguns que não devem ultrapassar as duas dezenas.

Se as gerações passadas puderam se orgulhar de seus esquadrões, a nossa tem o seu para usar como referencial.

Eu que gostava de entender o 4-4-2 contra o 3-5-2, hoje estou adorando não entender absolutamente nada do que faz esse incompreensível e magnífico Barcelona.

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