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CUCA GUARDA O URUBU NO BOLSO E ERGUE SUA CRISTA DE GALO

Cuca guardou o urubu no bolso e ergueu sua crista de Galo. Com louvores, derrubou de vez a tese de que é fadado ao fracasso. Não é e não é de agora. Embora tenha sido nessa classificação de seu Atlético para as finais da Libertadores que ele enterrou de vez qualquer argumento dos que ainda sustentavam a tese da piada pronta.

Cuca chora na vitória e na derrota, pois vive de futebol e vive o futebol. Existem os líderes que pregam a sobriedade ou a frieza diante de situações, mas não estes os exemplos mais enfáticos das emoções que o esporte Rei gera nas pessoas.

O multicampeão Felipão chora ainda hoje com suas conquistas. Muricy Ramalho e Abel Braga também. Tite, até outro dia era uma amálgama do que hoje tentam estampar na testa de Alex Stival, o técnico finalista da Libertadores de 2013, também. E com ele as piadas feitas também já eram injustas.

Tanto Tite quanto Cuca não possuem, ou não possuíam, o cartaz dos outros supramencionados. Não tinham a retórica profissional para “escolher” onde trabalhar. E nem por isso deixavam de fazer grandes trabalhos.

Tite já em 2006, em sua breve, mas positiva passagem pelo Palmeiras, praticamente livrou o time do rebaixamento. Acabou sendo demitido injustamente por bater de frente com a direção que então comandava o clube. A troca em meio a disputa daquele BR quase fez o rebaixamento que viria em 2012 ocorrer seis anos antes. E essa indiferença toda por parte da daquela direção alviverde se deu mesmo já tendo o técnico gaúcho títulos respeitáveis como o Gauchão de 2000, onde com o seu humilde Caxias bateu o forte Grêmio nas finais. Feito que repetiu no ano seguinte pelo próprio Grêmio, conseguindo ainda a Copa do Brasil contra o Corinthians. Podemos citar também sua primeira passagem pelo Corinthians, quando em 2004 tirou o time da zona do rebaixamento e o conduziu a um honroso quinto lugar. Mas Tite, assim como Cuca, talvez não fizesse uso de media training, não se preocupava com a ostentação, mas sim com seu trabalho. Tanto que mesmo após salvar o time do rebaixamento que viria mais tarde, foi desdenhado por Kia e cia limitada da MSI, que não enxergavam nele a condição de conduzir o forte time que viria a ser montado no ano seguinte.

O resto da história, a contabilizar sua passagem positiva pelo Inter e o sucesso atual no Corinthians, todo mundo conhece. Tite tornou-se grande, mas precisou emplacar uma conquista inédita pelo Corinthians para conseguir essa afirmação. Pelo Corinthians (e poderia ser o São Paulo, o Grêmio ou o Inter, o Cruzeiro, o Fluminense), onde sabemos – e aqui não cabem ponderações acerca de teorias conspiratórias, apenas constatações – tudo acontece muito mais facilmente do que pelo Atlético Mineiro ou pelo Botafogo, por exemplo.

Clubes onde Cuca desenvolveu trabalhos respeitáveis. Mas antes, em clubes com dificuldades e exposição ainda menores, ele já mandava bem na arte do riscado. Pelo Goiás em 2003, salvou o alviverde de rebaixamento certo, aceitando assumir a bronca com o time na última posição na virada do turno e o entregando ao final daquele BR na nona colocação e com vaga na Sulamericana. Na temporada seguinte conduziu o São Paulo, que não disputava a Libertadores há dez anos, às semifinais, onde foi eliminado pelo Once Caldas, que viria a ser o campeão. Como não tinha “cartaz”, foi descartado pela direção tricolor. Mas deixou a semente de seu trabalho com as presenças de Danilo e Grafite, que no ano seguinte seriam campeões da Libertadores pelo time do Morumbi.

Depois de passagens medianas por Grêmio, Flamengo e São Caetano , Cuca assumiu um Botafogo combalido por temporadas consecutivas de insucesso e descaso por parte de enorme parcela da imprensa e descaso do torcedor adversário. Formou um conjunto forte e reconduziu o Fogão às disputas em certames nacionais. Se não conseguiu títulos, devolveu parte da dignidade perdida pelo clube ao longo dos anos.

E foi em sua passagem pelo Botafogo, após duas derrotas em finais de cariocas para o Flamengo, ao chorar dignamente a derrota, que Cuca ganhou um apelido de “chorão”. E para o torcedor médio, enxergar com profundidade o trabalho de profissionais como Cuca, torna-se desnecessário diante da possibilidade de se fazer piada. Com enorme ajuda da imprensa, óbvio.

A pergunta que fica até aqui é: Quem mais conseguiu naqueles anos todos emplacar um trabalho tão emblemático com o Botafogo? Autuori no longínquo 1995?

Fato é que Cuca carregou o estigma da derrota injustamente, quando muitos outros antes dele sequer conseguiam dar o respeito ao clube. E o técnico seguiu assim, sem fortalecer seu cartaz, sem conseguir transformar seus respeitosos trabalhos até então em argumento para assumir clubes com condição real de lhe dar títulos. E nem por isso se fez de rogado. Tanto que em 2009 assumiu o Fluminense. E talvez em um dos trabalhos mais importantes dentro da história do tricolor, salvou o clube de mais um rebaixamento tido como certo por todo mundo. Todo mundo e a matemática, que apontava em 99% as chances do time ir para a série B. Mas com um trabalho que certamente foi muito além do técnico – é inimaginável acreditar que naquela altura do campeonato fosse possível fazer grandes modificações táticas em um elenco destroçado – mas possivelmente de convencimento de que era possível, algo impensável em se tratando daquele Cuca, ele e aquele time conseguiram uma sequencia inacreditável na reta final do BR09 e se livraram da queda. No mesmo ano ainda foi vice campeão da Copa Sulamericana.

Como se pode ver, só trabalhinho tranquilo, coisa suave, em clubes super bem estruturados, sem margem para elogios. Todos eles para Cuca, por favor.

Nesse meio tempo antes de assumir o Atlético Mineiro, Cuca levou o Cruzeiro ao vice campeonato brasileiro de 2010. E então veio o Galo.

O início não foi bom, com derrotas consecutivas e entrega do cargo por sua parte. Mas além de competente, Cuca deve ser gente boníssima, já que o elenco o segurou no cargo. Naquele ano o time se recuperou e fugiu do rebaixamento.  Já no ano seguinte foi campeão mineiro invicto, caindo nas graças do sofrido torcedor atleticano. Talvez tenha rolado identificação mutua. Um técnico injustiçado e um clube com uma torcida massacrada por ano de ostracismo e de sucesso do maior rival.

A identificação virou sucesso quando naquele mesmo ano Cuca conduziu o Galo ao vice campeonato brasileiro. Mas melhor do que exaltar o feito, a grande maioria preferiu dar sustentação ao coro do fracasso e evidenciar a perda do título.

Quando havia sido a última vez que o Galo tinha se visto como protagonista em âmbito nacional mesmo? E vaga (direta) em Libertadores, quando?

Pois bem, Cuca levou o Galo à sua 5ª participação na maior competição do continente e mesmo diante da indiferença dos rivais, além da falta de vivência em certames internacionais, emplacou um time de futebol vistoso – de longe o melhor do país – e se classificou, com sobras, tendo a melhor campanha da 1ª fase. Mas aí o futebol bonito e o jogo de resultados irrefutáveis não valiam tanto quanto a retórica de “insucessos”.

E então o time que se classifica em 1º não chega nunca a uma final, ou não chegava desde 1996, com o River Plate. E de fato, nenhuma equipe que tenha feito a melhor campanha na 1ª fase da Libertadores desde então chegou mesmo a uma final.

E “pô, time do Cuca, sem chance”.

Não apenas conduziu o time à final, como o fez ajoelhado, chorando, rezando, como manda a cartilha de “derrotado” de Cuca. Mais que isso tudo. Rezando a cartilha da coragem. Ou qualquer outro professor brazuca teria saco roxo para sacar os dois melhores atacantes do time, com a vaga indo para o brejo, por pura convicção tática?

Cuca sacou Bernard e Tardelli, presos taticamente (palavras do próprio Cuca) e mandou Guilherme e Alecssandro. E não é que Guilherme fez o gol que levou a decisão para as penalidades?

Sorte? Amuleto? Reza? Superstição? Eu prefiro chamar de competência e confiança.

Cuca entende da arte do riscado e não é de agora. Não é de agora que merece os louros da glória. E que ela venha com ele ajoelhado, rezando, agarrado ao seu amuleto de sorte. E se não vier, nada muda. Do outro lado terá um Olimpia tricampeão da Libertadores, também querendo o título. Mas que ele e o Galo merecem, disso eu não tenho dúvidas.

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